Brincando pela internet consegui encontrar o texto de Anselmo Borges. Mandei para o e-mail da turma justamente com o título que posto aqui. Não deu outra, teve gente que não entendeu. Portanto, tento explicar.
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1 - O pior cego é o que não quer ver. Vemos exposto um intento desesperado para mostrar a manutenção da religião no século XXI. Em minhas vistas é cegueira por confundirmos cristianismo com religião. Concordo que errôneamente ele virou, mas o intento aqui apontado é dizer que mesmo as reações críticas abordadas no século XIX não causaram danos na "igreja". Falácia, o século XIX causou crateras que sangram. E nem Karl Barth, Rudolf Bultmann e Paul Tillich com todos os sacerdotes católicos juntos conseguiram reconstituir tais lesões.
2 - fator abridor de olhos - vide "fator Melquisedeque".
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Aproveite a leitura, sempre serve como incentivo a uma "hermenêutica alegoricamente livre".
Thiago Barbosa
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opiniao
O SÉCULO XXI SERÁ RELIGIOSO?
por Anselmo Borges padre e professor de Filosofia06 Setembro 2008
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Há aquele dito, constantemente repetido, atribuído a André Malraux: "O século XXI será religioso ou pura e simplesmente não será." Mas ele negou ser o seu autor. Prevenindo para o perigo do vazio espiritual da civilização ocidental - "civilização das máquinas e da ciência superpotente, mas incapaz de dar ao Homem uma razão de viver" -, o que disse foi: "Nunca disse isso. O que digo é mais incerto. Não excluo um acontecimento espiritual à escala planetária."
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Segundo a revista Philosophie magazine, no número de Setembro, donde tiro as citações, a expressão de Malraux acabaria por antecipar o grande abalo, à escala do planeta, da passagem do racionalismo das Luzes ao retorno do religioso nas suas múltiplas facetas. Ainda no quadro do Iluminismo, E. Renan escreveu, em O Futuro da Ciência, que "a humanidade que sabe" iria substituir "a humanidade que crê". Depois, os "filósofos da suspeita", Marx, Nietzsche e Freud, denunciarão a religião não apenas como superstição, mas como neurose colectiva, ópio do povo, ódio da vida, concluindo o seu processo com a sentença da "morte de Deus". Mas, como escreve Martin Legros, afinal, "o século XXI parece estruturar-se mais à volta das identidades e das crenças religiosas do que da razão". Para Max Weber, a modernidade caracterizava- se pelo "desencantamento do mundo", entendido como "o abandono da magia como técnica de salvação".
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Tinha, no entanto, a convicção de que o processo de racionalização deixaria em aberto a questão do sentido. A secularização não responde às perguntas metafísicas. Assim, outro sociólogo, Peter Berger, reviu a sua tese da secularização no sentido de secularismo, escrevendo que "o mundo actual é tudo menos o mundo secularizado que tinha sido anunciado, para gáudio de uns e lamento de outros, por tantos analistas da modernidade. Não existe nenhuma razão para pensar que o mundo do século XXI será menos religioso". Os dados estão aí, quando se considera "a geopolítica da fé". Há um progresso fulgurante do islão, com 1300 milhões de fiéis, ultrapassando o número dos católicos, e do neo-protestantismo - sobretudo do evangelismo pentecostal, "centrado na adesão pessoal, no milagre e no cuidado da cura espiritual" -, com milhões de conversões na África, na Ásia e na América Latina e que será "a grande religião do século XXI (maioritária a partir de 2050)". A Europa constitui a excepção. Mas, mesmo aqui, atente-se, por exemplo, nas declarações dos políticos, impressionantes. "O pensamento das Luzes quis fazer-nos crer que o progresso irresistível da humanidade era sinónimo da extinção das religiões. Que erro!" (Tony Blair). "Foram as religiões que primeiro nos ensinaram os princípios da moral universal" (Nicolas Sarkozy). "A cooperação entre as nações, as religiões e as culturas, é a base do Estado russo"(Dimitri Medvedev).
O SÉCULO XXI SERÁ RELIGIOSO?
por Anselmo Borges padre e professor de Filosofia06 Setembro 2008
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Há aquele dito, constantemente repetido, atribuído a André Malraux: "O século XXI será religioso ou pura e simplesmente não será." Mas ele negou ser o seu autor. Prevenindo para o perigo do vazio espiritual da civilização ocidental - "civilização das máquinas e da ciência superpotente, mas incapaz de dar ao Homem uma razão de viver" -, o que disse foi: "Nunca disse isso. O que digo é mais incerto. Não excluo um acontecimento espiritual à escala planetária."
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Segundo a revista Philosophie magazine, no número de Setembro, donde tiro as citações, a expressão de Malraux acabaria por antecipar o grande abalo, à escala do planeta, da passagem do racionalismo das Luzes ao retorno do religioso nas suas múltiplas facetas. Ainda no quadro do Iluminismo, E. Renan escreveu, em O Futuro da Ciência, que "a humanidade que sabe" iria substituir "a humanidade que crê". Depois, os "filósofos da suspeita", Marx, Nietzsche e Freud, denunciarão a religião não apenas como superstição, mas como neurose colectiva, ópio do povo, ódio da vida, concluindo o seu processo com a sentença da "morte de Deus". Mas, como escreve Martin Legros, afinal, "o século XXI parece estruturar-se mais à volta das identidades e das crenças religiosas do que da razão". Para Max Weber, a modernidade caracterizava- se pelo "desencantamento do mundo", entendido como "o abandono da magia como técnica de salvação".
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Tinha, no entanto, a convicção de que o processo de racionalização deixaria em aberto a questão do sentido. A secularização não responde às perguntas metafísicas. Assim, outro sociólogo, Peter Berger, reviu a sua tese da secularização no sentido de secularismo, escrevendo que "o mundo actual é tudo menos o mundo secularizado que tinha sido anunciado, para gáudio de uns e lamento de outros, por tantos analistas da modernidade. Não existe nenhuma razão para pensar que o mundo do século XXI será menos religioso". Os dados estão aí, quando se considera "a geopolítica da fé". Há um progresso fulgurante do islão, com 1300 milhões de fiéis, ultrapassando o número dos católicos, e do neo-protestantismo - sobretudo do evangelismo pentecostal, "centrado na adesão pessoal, no milagre e no cuidado da cura espiritual" -, com milhões de conversões na África, na Ásia e na América Latina e que será "a grande religião do século XXI (maioritária a partir de 2050)". A Europa constitui a excepção. Mas, mesmo aqui, atente-se, por exemplo, nas declarações dos políticos, impressionantes. "O pensamento das Luzes quis fazer-nos crer que o progresso irresistível da humanidade era sinónimo da extinção das religiões. Que erro!" (Tony Blair). "Foram as religiões que primeiro nos ensinaram os princípios da moral universal" (Nicolas Sarkozy). "A cooperação entre as nações, as religiões e as culturas, é a base do Estado russo"(Dimitri Medvedev).
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Certamente, trata-se de agradar aos eleitores, mas, por outro lado, reflectindo uma atenção crescente ao papel das religiões nas sociedades actuais. De qualquer modo, mesmo na Europa, apesar da continuidade do processo da secularização, a fé não desapareceu e o ateísmo confesso é minoritário. Segundo a sondagem sobre os valores dos europeus (European Values Survey), 6% declaram-se ateus, 31% não-religiosos e 57% religiosos. Dizem acreditar em Deus 69%, ainda que só 40% lhe atribuam carácter pessoal, pois 30% concebem-no como uma força vital. Entre os católicos, 53% acreditam na vida depois da morte. O que está em causa é sobretudo a religião institucional, no quadro de uma individualizaçã o da fé, muitas vezes em autogestão.
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Para Marcel Gauchet, conhecido pela obra O Desencantamento do Mundo, há três inquietações que explicam o retorno do religioso contemporâneo: quando o futuro parece afundar-se, "a procura de um laço identitário com o passado", essencialmente religioso; face à solidão, sobretudo moral, dos indivíduos, a necessidade de "um laço de convicção com os outros"; depois, frente à desgraça, à dor, ao sofrimento, ao trágico da existência, a procura de "um discurso sobre a verdade da existência na sua ambivalência" e de sentido último.
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