A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

sendo José...

Ainda me assola o pesadelo do que será. É meu peso, minha busca, minha angústia, a eterna busca do que será. Será? Isso, será. O que será quando findar-se esse que é um período de preparação que busco - como o arfar de um afogado - caminhar com minhas próprias pernas, vivendo por minha própria competência, com uma dificuldade que é só minha e de mais ninguem, na ânsia de um rigor que me permita olhar ao espelho e ver os passos trilhados entre pedregulhos e trevas?


Isso é teologia, é viver seu próprio "EU", é buscar ser o que se é, mas e quando findar-se a formação e já não for treino, for pra valer? Como será em 2012? Serei eu a sair ou apenas uma imagem criada e pensada por um sistema educacional-denominacional? Ainda serei "EU"? Serei? Ser, hei de Ser. Assim espero insone entre cefaléias e angustia, esperando a ESPERANÇA de SER o que há. Dá-lhe Drummond, afinal, somos todos José, ou o que se É.




José
1960 - ANTOLOGIA POÉTICA

E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio – e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...

Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?


Thiago Barbosa

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