A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Imagem não é nada?

Interessante como os aspectos físicos do campo da estética corporal estabelecem padrões limítrofes em nossas experiências quanto ao discurso que nos é apresentado, seja este discurso fruto de produção religiosa ou não.

Anos atrás tínhamos um medo grotesco do Lula. Sua aparência quase que impunha suas opções marxistas, das mais extremadas possíveis, a vasta barba e os cabelos degringolados fizeram, creio eu, que ele perdesse as eleições contra Collor. Não foram poucas as pessoas que confessaram o assombro pelas vestes “revoltas” e aspecto “conspirador–comuna” de nosso atual presidente, fazendo com que ele perdesse a eleição em questão. Tempos depois, barbas negras e revoltas a menos, cabelos bem cortados e já grisalhos pelo tempo mensurável e experiência imensurável, Lula volta por “sobre a carne seca”. Elege-se pela primeira e consequentemente pela segunda vez. Não foram poucos os comentários sobre sua aparência. Interessante não ter eu percebido tanta mudança no discurso, mas parece que a aparência de Lula fez com que a intensidade do vermelho na flâmula petista tornou-a um pouco mais rósea, mesmo sendo o mesmo discurso em sua essência.

Hoje experimento a mesma situação e percebo como as pessoas nem ligam para o que você diz, mas sim para quem o diz. Optei por livre e espontânea vontade “tosar” as madeixas que me acompanhavam já durante três anos. Motivos? Minha total indisposição para o cuidado que é requerido. Os tempos de Heavy metal e diálogos com o mundo underground já não são uma constante. Por isso não senti nenhuma espécie de remorso durante o corte, talvez uma inerente saudade dos dias de show e encontros com os “irmãos de camiseta preta”. Com isso desconstruo a primeira argumentação que me foi apresentada, a de que cortei os cabelos por exigência da igreja ou por não suportar a pressão sobre minha aparência pouquíssima formal. Sinceramente, o mundo eclesiástico me pressiona por ainda requerer uma postura aceitável, portanto, fui pressionado, mas com muito respeito. Não fui exigido, ao contrário, fui questionado sobre o "porque" de ter cortado o cabelo pela minha igreja “mantenedora” ,que sempre se mostrou bastante acolhedora e benevolente para com minha aparência, embora soubesse da vontade de boa parte de sua liderança em me ver seguindo a mais formal etiqueta eclesiástica (eles não gostariam que eu o fizesse por qualquer motivo que não fosse minha própria vontade). A realidade do motivo é a de que o calor meridional de nosso país, bem como a não necessidade de me afirmar pela aparência me libertaram dos moldes modais que por ventura me sejam cobrados. Minha mais pura e completa vontade, ninguém teve nenhuma influência, por menor que fosse ,sobre meu novo visual.

Mas minha observação vem mediante o discurso que sempre me acompanhou e que sempre proferi, tanto nas comunidades de fé que eventualmente sou convidado a falar, como na academia e no próprio cotidiano. Interessantíssimo como as pessoas, confrontadas com o visual pouco convencional (parecendo um índio “Omeca” como diz o professor Osvaldo), tomavam meus dizeres como heresia, antibíblico, liberal em demasia. Sempre me coloquei a tentar saber os motivos desses dizeres, porém, assumo todas as responsabilidade sobre o que digo, portanto, sempre estive muitíssimo tranqüilo quanto a estas posições “contrárias”. Agora, após o novo visual, os comentários sobre meus dizeres deixaram de assinalar a heresia e abordam a “originalidade” nas hermenêuticas, esquecem-se do antibiblicismo e apontam a argumentação científica do texto, o evangelho “liberal em demasia” agora impacta o homem a perceber um evangelho que perpasse antes de tudo a consciência desse homem e sua relação pessoal com a divindade. Minhas pregações continuam sendo fruto dos meus medos, sentimentos, pensamentos, estudos, sempre dizem mais a meu respeito que ao outro. O que digo, digo antes a mim mesmo, posteriormente, os ouvintes estejam à vontade para uma analise do conteúdo do discurso e sua aplicação ou não na sua relação de pessoalidade com o divino. Parece que me tornei um excepcional preletor por ter cortado o cabelo. Em minha dura e fria análise continuo medíocre, afinal, não há grandes descobertas, apenas apontamentos sobre minha relação com Deus, tudo no campo da pessoalidade, da experiência pessoal, onde cada um é responsável por seu acesso ao Criador. Mesmo assim ainda ouço: Agora sim, esse é meu seminarista! Esse Será um “pastorzão”! (rs)Tudo por um corte de cabelo.

Acho que se Jesus tivesse visitado o cabeleireiro, talvez tivesse escapado de seus algozes, bem como de seu trágico fim terreno.


Thiago Barbosa

Um comentário:

  1. Pode este mundo não "virtual", mas sim "visual" tirar nossas mechas sobre o julgo da ditadura do "rótulo cristão" atual, porém o nosso interior sempre abrigará um coração nazireu "cabeludo".
    Na Comunidade Zadoque ou na Caverna de Adulão você sempre será um pastor em potencial...e eu estarei lá para ministrar louvor na hora que precisares....rsrsrs

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