A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Imagem não é nada?

Interessante como os aspectos físicos do campo da estética corporal estabelecem padrões limítrofes em nossas experiências quanto ao discurso que nos é apresentado, seja este discurso fruto de produção religiosa ou não.

Anos atrás tínhamos um medo grotesco do Lula. Sua aparência quase que impunha suas opções marxistas, das mais extremadas possíveis, a vasta barba e os cabelos degringolados fizeram, creio eu, que ele perdesse as eleições contra Collor. Não foram poucas as pessoas que confessaram o assombro pelas vestes “revoltas” e aspecto “conspirador–comuna” de nosso atual presidente, fazendo com que ele perdesse a eleição em questão. Tempos depois, barbas negras e revoltas a menos, cabelos bem cortados e já grisalhos pelo tempo mensurável e experiência imensurável, Lula volta por “sobre a carne seca”. Elege-se pela primeira e consequentemente pela segunda vez. Não foram poucos os comentários sobre sua aparência. Interessante não ter eu percebido tanta mudança no discurso, mas parece que a aparência de Lula fez com que a intensidade do vermelho na flâmula petista tornou-a um pouco mais rósea, mesmo sendo o mesmo discurso em sua essência.

Hoje experimento a mesma situação e percebo como as pessoas nem ligam para o que você diz, mas sim para quem o diz. Optei por livre e espontânea vontade “tosar” as madeixas que me acompanhavam já durante três anos. Motivos? Minha total indisposição para o cuidado que é requerido. Os tempos de Heavy metal e diálogos com o mundo underground já não são uma constante. Por isso não senti nenhuma espécie de remorso durante o corte, talvez uma inerente saudade dos dias de show e encontros com os “irmãos de camiseta preta”. Com isso desconstruo a primeira argumentação que me foi apresentada, a de que cortei os cabelos por exigência da igreja ou por não suportar a pressão sobre minha aparência pouquíssima formal. Sinceramente, o mundo eclesiástico me pressiona por ainda requerer uma postura aceitável, portanto, fui pressionado, mas com muito respeito. Não fui exigido, ao contrário, fui questionado sobre o "porque" de ter cortado o cabelo pela minha igreja “mantenedora” ,que sempre se mostrou bastante acolhedora e benevolente para com minha aparência, embora soubesse da vontade de boa parte de sua liderança em me ver seguindo a mais formal etiqueta eclesiástica (eles não gostariam que eu o fizesse por qualquer motivo que não fosse minha própria vontade). A realidade do motivo é a de que o calor meridional de nosso país, bem como a não necessidade de me afirmar pela aparência me libertaram dos moldes modais que por ventura me sejam cobrados. Minha mais pura e completa vontade, ninguém teve nenhuma influência, por menor que fosse ,sobre meu novo visual.

Mas minha observação vem mediante o discurso que sempre me acompanhou e que sempre proferi, tanto nas comunidades de fé que eventualmente sou convidado a falar, como na academia e no próprio cotidiano. Interessantíssimo como as pessoas, confrontadas com o visual pouco convencional (parecendo um índio “Omeca” como diz o professor Osvaldo), tomavam meus dizeres como heresia, antibíblico, liberal em demasia. Sempre me coloquei a tentar saber os motivos desses dizeres, porém, assumo todas as responsabilidade sobre o que digo, portanto, sempre estive muitíssimo tranqüilo quanto a estas posições “contrárias”. Agora, após o novo visual, os comentários sobre meus dizeres deixaram de assinalar a heresia e abordam a “originalidade” nas hermenêuticas, esquecem-se do antibiblicismo e apontam a argumentação científica do texto, o evangelho “liberal em demasia” agora impacta o homem a perceber um evangelho que perpasse antes de tudo a consciência desse homem e sua relação pessoal com a divindade. Minhas pregações continuam sendo fruto dos meus medos, sentimentos, pensamentos, estudos, sempre dizem mais a meu respeito que ao outro. O que digo, digo antes a mim mesmo, posteriormente, os ouvintes estejam à vontade para uma analise do conteúdo do discurso e sua aplicação ou não na sua relação de pessoalidade com o divino. Parece que me tornei um excepcional preletor por ter cortado o cabelo. Em minha dura e fria análise continuo medíocre, afinal, não há grandes descobertas, apenas apontamentos sobre minha relação com Deus, tudo no campo da pessoalidade, da experiência pessoal, onde cada um é responsável por seu acesso ao Criador. Mesmo assim ainda ouço: Agora sim, esse é meu seminarista! Esse Será um “pastorzão”! (rs)Tudo por um corte de cabelo.

Acho que se Jesus tivesse visitado o cabeleireiro, talvez tivesse escapado de seus algozes, bem como de seu trágico fim terreno.


Thiago Barbosa

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Sherlok Homes, Desmistificação e Leitura Bíblica

1. Depois de pensar uma forma de fazer com que Kel se sentisse melhor de sua indisposição mensal, essa, que a atinge todos os meses e a deixa realmente tristonha e ligeiramente embravecida, tive a brilhante idéia (brilhante porque penso ter sido produtivo para ela e, principalmente, para mim) de irmos ao cinema para assistir as sagas do detetive mais famoso de todos os tempos: Sherlok Homes. Suas aventuras são de tirar o fôlego, literalmente. Parece que por todo o enredo do filme, nossas emoções sofrerão com os vários picos de tensão salpicados com um inteligente senso de humor por parte de nosso caríssimo detetive britânico. Mas o que me deixou intrigado não foram as fantásticas cenas de suspense, ou as formidáveis enrascadas em que se envolvia Homes e seu fiel amigo Watson. O que me deixou a pensar, num exercício de principiante, de um pensador ainda em formação, foi exatamente o dualismo Misticismo x Racionalismo, expressos, respectivamente, na pessoa de Homes e de seu Inimigo.


2. O detetive é um homem extremamente racional, suas intuições permitem alcançar uma síntese “quase exata” dos fatos, uma solução, o que lhe permite resolver os problemas à sua frente. Uma mente racional que, especialmente nessa aventura, se põe em conflito com uma problemática, que, de início, é não- natural, fugindo do mundo sensível, possível, real. Homes se depara com os poderes supranaturais da magia até que, ao chegarmos no final de todo o mistério, ou melhor dizendo, quando ele chega ao final de suas investigações, pode, então, demonstrar a “supremacia” da razão sobre o misticismo que envolvia todo o caso. O grande detetive se lança sobre o problema que causava tanto temor (por se tratar de algo além do natural) às gentes da época, como se lança um filósofo, principalmente moderno, sobre um problema filosófico. Utiliza-se de metodologia, seja ela discursiva ou intuitiva. A forma de entender do que realmente se constitui o mistério é “garimpando”, duvidando, questionando, analisando e desconstruindo toda a camuflagem “espiritualizada”, mitológica, bem elaborada pelo suspeito, o que fazia crer, todos os envolvidos ou os que se envolviam.


3. Honestamente, não deixei de experimentar-me na difícil arte da reflexão teológica, fazendo uma aproximação da prática investigativa analítica de Homes com a investigação exegética moderna das escrituras sagradas, a bíblia. Assim como essa mente brilhante da investigação policial, as ciências bíblicas não se contentam em analisar formas “camufladas” dos textos bíblicos, sejam as que herdamos da tradição judaico-cristã, seja das repetidíssimas interpretações dessa mesma fonte. O que os teólogos-biblistas modernos desejam é apreender o que está “por trás das palavras”, ouvindo as “muitas vozes” dentro de inumeráveis circunstâncias. É saber o que é, o que está, debaixo de um “emaranhado místico-espiritualizante” no qual deixamo-nos envolver psicologicamente/emocionalmente/culturalmente, aponto de negarmos toda e qualquer possibilidade de investigação que realce ou que revele as “coisas” dentro de seu contexto histórico de fato. .


4. Ao final do filme, Sherlok Homes desvenda mais um mistério. Esse, um tanto diferente de muitos outros que já havia desvendado. Fica claro a grande mentira construída pelo suspeito. Os crimes que possuíam um teor sobrenatural tornam-se agora crimes arquitetados a fim de alcançar um objetivo, um plano ideológico e político afim de obter controle e governo. Havia uma intensão de fundo, um manipulador por trás de toda aquela magia, alguém que fazia crer na transcendência dos assassinatos parecendo “obras do além” a fim de encobertar e não transparecer as “reais” intensões. Foi assim que muitos reis judeus justificaram seus delitos, seus abusos. As injustiças sócias, a opressão econômica, tudo se justificava a partir de um discurso cheio de magia e autoridade dos “céus”. O que não é diferente daquilo que os especialistas tem desvelado no que se refere à leitura dos textos bíblicos na história da civilização ocidental. A estrutura patriarcal e colonizadora do ocidente europeu é um construto teológico judaico-cristão, que tem no poder político-religioso da cristandade a criação de identidades universais, que são vinculadas a um Deus transcendente e patriarcal a partir das representações e intervenções político-sacerdotais da cristandade européia.[1]. O famosos detetive desvenda o caso revelando sua imanência, nada de sobrenatural, nada de magia, nada de discursos mitológico, somente truques bem arquitetados que passam despercebidos aos olhos, acostumados a crer , olhos não inquiridores.


5. Podemos ler a bíblia somente crendo, sem ao menos permitir-se perguntar: porque ?, como?, quando?, em que contexto ou situação? quem disse? porque disse?. Ou podemos investigar, como um detetive que procura pistas para resolver um mistério. Não quero de forma alguma dizer que não precisamos crer, pelo contrário, como diz Gilberto Gil “andar com fé eu vou, que a fé não costuma faia”. A fé é parte de nossa constituição como seres do mundo, aprendemos isso e precisamos disso. O que nos propõe os biblistas e o que, agora, acompanho, é uma mente investigativa, uma fé não alienada, uma “leitura de detetive” para que nossa mente naturalmente “curiosa”, possa dormir em paz todas as noites. Não nego também ser isso uma tarefa difícil. É extremamente difícil perceber-se num circulo ideológico que, de certa forma, nos “conduz” na vida social. O circulo ideológico consiste precisamente na relação mútua, dialética entre nossa práxis e ateoria que se apresenta como sua inteligência e explicação. A práxis pede, exige uma teoria, uma inteligência. Esta teoria, inteligência, por sua vez, confirma a práxis, reforça-a. Assim circulamos dentro dessa relação. Cada vez mais a nossa práxis fica justificada pela teoria. [2]. É assim que aprendemos a fé, o que dizem é o que praticamos, o que acreditamos.


6. O mesmo espírito investigador de um filósofo deve ser o espírito de um estudante das escrituras, de um teólogo ou de um biblista. O desejo por autonomia e a coragem de romper com o(s) circulo ideológico, de alcançar entendimento no exercício da própria razão, deveria ser o espírito dos cristãos, principalmente, os de confissão protestante. Como diz Morente, “nós devemos permitir com que nos tome aquela alma lúdica, aquele instinto infantil, curioso e inquiridor” pois com certeza “cavando bem fundo” podemos nos aproximar mais daquilo que corresponde ao real, ao que pode ser historicamente tangível. Talvez, tornando-se necessário desmistificar algumas coisinhas. A perspectiva “maximalista” dos textos bíblicos, importada e assumida em nossas comunidades, é símbolo de verdade epstemológica, possui força política e é, de forma mais específica, nosso “círculo”. Nossa constituição cristã é forjada nessa prédica, é por esse viés que compreendemos a realidade, é nesse ambiente que gostamos de permanecer. Mais confortável é receber pronto tudo aquilo que precisamos para encarar o mundo, o que está fora do círculo. É angustiante a idéia do diálogo com o que está fora de “meus” limites; sim, não o nego, mas talvez seja necessário Romper com (em) fé (utilizando o título da famosa música), ou seja, romper sem, no entanto perder a fé,os limites que conduzem nossa consciência.



7. Faz-se necessário, principalmente nos dias atuais, que tenhamos uma “mente analítica” , como de a de Homes.



Jonathan


[1] CABRAL, Jimmy Sudário; Bíblia e Teologia Política: escritura,tradição e emancipação- Rio de Janeiro: Mauad X ; Instituto Mysterium; 2009
[2] LIBÂNIO, J. B.; Formação da Consciência Crítica: 2. subsídios sócio-analíticos; Rio de Janeiro; Vozes; 1979

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Deus é deus para benefícios e malefícios

Realmente me incomoda o fato de assumir a autoridade de Deus. Não pelo simples fato de se assumir tal autoridade, mas pelo fato de que somos extremamente tendenciosos a assumir os fatos corriqueiros da vida como supremacia divina apenas quando tais fatos são benéficos a nosso respeito.
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Se formos assumir a autoridade de Deus devemos assumi-la por completo, alías, lendo o livro de jó, parece que as vontades e permissões divinas perfazem bem mais as partes ruins do que boas, triste que alegres. Assim, Deus assume seus ares de autoridade tanto nas proposições agradáveis e suaves da vida tanto quanto as assume nas tristezas e angústias.
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Assumir a autoridade divina sob nenhum aspecto é ignorar a autonomia humana quanto a suas atitudes, suas responsabilidades como seres emancipados que somos. Assim sendo, assumir a autoridade de Deus, ou "dos deuses" em nossa vida é assumir a possibilidade de que bem e mal podem ser vontade dos "senhores metafísicos". Para nós humanos resta apenas a possibilidade de sermos responsáveis por nossas vidas.
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Assim, na riqueza ou na pobreza, na saúde ou na doença, nas confraternizações ou profundíssimos momentos de solidão, Deus ainda é soberano se assim o dissermos e assumirmos. Portanto prepare-se, se disseres ser Deus autoridade sobre sua vida, assuma que essa é uma afirmação tanto para bem quanto para mal.
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Thiago Barbosa

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Quando os quadrinhos dizem as regras do jogo


Sempre gostei dos quadrinhos. Ver super-heróis, donzelas em perigo,e, é claro, os magistrais vilões. Interessei-me inicialmente por Chico Bento e a trupe da Mônica. Adolescente underground que fui, e penso ainda ser, deparei com o mundo subterrâneo e subcultural dos “Marvel Comics”, bem como os épicos fantasiosos de Conan. Mais tarde, pelos idos de 1996 apresentaram o RPG, principalmente o STORYTELLER gótico de VAMPIRE: the Mascarade. Entupia-me de leituras góticas, histórias baseadas nas idades das trevas, no medievo, hora fantasiosas, hora reais, hora mitológicas. Após o mundo do RPG mergulhei profundamente na história dos povos antigos, amava a pesquisa, livros empoeirados, letras e escritas com datações antiquíssimas. De modo que, quando encontrava um discurso religioso, entendia a mente que o concebia, enxergava nele história e ficção, juntíssimas, de mãos dadas, no intuito de levar o povo à devoção “divinamente inspirada”.



Com o tempo percebi a baixeza da mistura entre ficção e realidade histórica. A baixeza, por minha conta, se dá no intuito em que nem todas as partes envolvidas no jogo sabem das regras. No RPG, o mestre sempre trazia a memória a natureza fantasiosa de suas descrições. Assim, os demais jogadores sabiam que, por mais realística que fossem as descrições, ainda assim seriam fantasiosas. Já nos jogos da fé, quem sabe as regras do jogo é o lider, o pastor, o “religioso mor”. As ovelhas, o outro lado do jogo, pouco sabem sobre a realidade e ficção das leituras feitas. Passa a ser um jogo tendencioso, de mal caráter, onde um sabe de seu poder de manipulação e mescla entre história real e realidade ficcional. Já a outra parte apenas se entrega, na ilusão pueril de que as palavras ditas sejam todas realidades palpáveis e divinamente inquestionáveis.



Se queres jogar o jogo, abra as regras. Somente assim seremos ao menos ansiosos pela honestidade junto aos jogos da fé.



Lembro dos ditos e quadrinhos, quase que escatológicos, de Robert Crumb.

Robert Crumb (30 de agosto de 1943, Filadélfia, Pensilvânia) é um artista e ilustrador, reconhecido como um dos fundadores do movimento underground dos quadrinhos, e é considerado frequentemente como a figura mais proeminente nesse movimento, tendo como ponto de partida a publicação do gibi artesanal "Zap Comix". Seus trabalhos foram bastante apreciados na cena hippie, tendo deixado marcado nesta década a tira Keep on Truckin´ e os personagens Mr. Natural (que pode ser lido como uma sátira de Maharishi Mahesh Yogi e semelhantes, numa época em que era moda gurus espirituais) e Fritz The Cat, um gato boa vida que usa muitas drogas e tem uma vida sexual bastante lasciva.



Crumb foi tema de um documentário intitulado Crumb, lançado em 1994 pelo diretor Terry Zwigoff. O filme foca-se nele e em seus dois irmãos, os três com um certo grau de sociofobia, frutos da criação de um pai severo e uma mãe superprotetora. Há, sobretudo, bastante destaque no irmão mais velho, Charles, e sua influência sobre seu irmão Robert. É narrado, em certo momento, que Charles obrigava seus irmãos a desenharem quadrinhos, na infância.



Na década de 1970, começou a colaborar com o roteirista e arquivista Harvey Pekar, um homem da classe media baixa de Cleveland que narrou suas visões de mundo, mostrando o cotidiano tedioso da classe media americana, sem preocupações. Muitas vezes os percalços desta parceria foi retratada nos próprios quadrinhos feitos em parceria pela dupla.



Produziu frequentemente HQs autobiográficas com sua esposa, Aline Kominsky-Crumb, desenhadas a quatro mãos e publicadas na revista The New Yorker. Tais obras estão sendo republicadas no Brasil pela revista Piauí.



Passou a adaptar obras literárias de autores como Franz Kafka, Charles Bukowski e Philip K. Dick. Em 2009 lançou a adaptação quadrinhistíca do Gênesis, o livro da bíblia. E é pensando em bíblia, religiosidade e sua produção em HQ do “ Bereshit” que apresento uma facção da entrevista idealizada e feita por Rosane Pavan em http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=5168.


Você acredita em Deus?

Não sou religioso. Mas fui criado no catolicismo. Em escola católica, de freiras e irmãs. Acredito que, quando criança, não tinha razões para desacreditar no que me contavam. Por volta de 15, 16 anos, comecei a fazer meus questionamentos. Rapidamente rompi com o catolicismo depois que comecei a questioná-lo. E passei a estudar outras idéias sobre o assunto, sobre as coisas chocantes que não lhe contam sobre a Igreja, sobre o comportamento dos papas. Especialmente na Idade Média, comportavam-se muito mal. Ainda se comportam. Parei de me confessar aos 16 anos. Nunca mais me tornei membro de uma igreja estabelecida ou de uma religião. Não sigo qualquer doutrina religiosa, de maneira alguma. Contudo, ainda me sinto muito interessado pela procura espiritual, mas de uma maneira mais ligada ao intelecto. Eu certamente acredito que existe uma força que move nossos destinos. Maior do que nós. Não sabemos o que é. É grande demais para que nós tenhamos qualquer chance de saber do que se trata. Mas é interessante estudar, perguntar-se, imaginar o que ela poderia ser. Eu pessoalmente não acho que alguém vá encontrar inspiração no Gênesis. As histórias são boas, mas como guia espiritual ou moral, não servem. Você terá problemas se ler o livro com essa intenção! É primitivo. A moral é tribal. Existe um plano. E o cara se sente honrado em segui-lo. Deus nos deu essa terra, essa terra pertence a nós, toda essa história... Contudo, procurei sempre ilustrar o que está no texto. Ló fez sexo com suas duas filhas, coisa muito estranha. Isto está escrito e eu desenhei. Eu evitei ser cômico, lúbrico, sensual, explícito. Se as pessoas se sentirem ofendidas com o que virem, problema delas. Não podemos agradar a todos. Especialmente pessoas seriamente religiosas. Não posso ajudá-las. Às vezes o texto não descrevia exatamente o que estava acontecendo. E então inventei o que ilustrar, até certo ponto. A cena diz: “Antes que Deus decidisse destruir a raça humana... Porque ele viu o mal no coração do homem.” Mas o que ele viu? Que mal o homem fez? Então eu tinha de mostrar que mal esse homem estava fazendo. Eu não estava indo contra o texto, porque o texto me deixava livre para imaginar que mal seria esse. Mas se o texto dissesse que os personagens se deitavam no chão, sim, eu os deitava no chão. Pessoas fazendo sexo, sim, eu desenhei.


Seu Deus é tradicional, um velho homem barbudo. Foi assim que ele se apresentou em seu sonho?


No meu sonho de 2000 ele era muito mais complexo. Mas eu decidi desenhá-lo velho, de longas barbas e severo, com a face do patriarca. E o fiz homem porque assim ele é descrito _ Ele, segundo o texto bíblico. Tudo isto partiu dos hebreus. Eu até pensei em fazê-lo mais judeu... em uma segunda leitura, havia mais componentes africanos... A história toda pertence à tradição semita. A europeia faz Deus com os cabelos loiros. Então decidi desenhá-lo de cabelos mais escuros, na tradição semítica.


Esse Deus que você viu no sonho não seria apenas você?


Eu? Bem, tudo o que aparece nos sonhos remete a alguma parte de nós mesmos. Pelo menos é o que dizem. Mas a imagem do sonho, tão vívida, definitivamente não pertencia a mim, estava do lado de fora. A verdade é que ele entrou em mim, falando comigo de alguma forma. Mas eu só fui capaz de visualizar essa criatura. Sua face era muito severa. E também repleta de ira. Um deus muito velho, com barba. O deus do Gênesis é o da justiça. Não é bonitinho, nem especialmente amigável.


Tudo parece muito respeitoso sob este aspecto para que alguém se incomode com suas ilustrações.


Eu imagino que os fundamentalistas, especialmente alguns judeus ortodoxos, se sentirão muito incomodados. Porque, segundo eles, não se pode ver a face de Deus, de forma alguma.


Talvez estejamos vivendo um momento especialmente de trevas, em que a liberdade de ação ou de pensamento pareça indesejável a grande parte das pessoas.


Concordo. Vivemos um momento obscuro.


Nunca lhe interessou desenhar o Novo Testamento?


Sempre me interessou o Gênesis. E a história do Novo Testamento apresenta algumas dificuldades para ser contada. Você tem de escolher uma entre as quatro versões de Mateus, Marcos, Lucas ou João. Não há como narrá-las todas. Ou então é preciso encontrar uma maneira de extrair as histórias interessantes e seguir com elas. Isto seria o que eu faria, provavelmente. Mas Chester Brown já contou essas histórias, e muito bem, em suas leituras dos evangelhos de Marcos e Mateus.


Talvez com Crumb tenha sido assim: Leu por demasia os quadrinhos de cultura underground, percebeu-se da mescla desonesta dos “mestres do jogo” entre realidade histórica e realidade ficcional,e, finalmente, cansado da desonestidade do jogo sentou-se, deixando o jogo para aqueles que ainda não se aperceberam das irregularidades.

Thiago Barbosa

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Brincando com o brinquedo errado - copiado do Blog de Danilo Gentili


Retirado de http://danilogentili.zip.net/


Depois dizem que com Religião não se brinca.


O bom desse brinquedo é que se o seu filho o quebrar, em 3 dias ele se conserta sozinho.

Segundo a embalagem o boneco é " totalmente articulado", ou seja, não é como aqueles bonecos que você compra e ficam pregadões, sem se moverem.

A embalagem ainda diz: "Ouça Jesus Falar". Certamente ele ensina os mandamentos de Deus como: "Não farás pra ti imagem alguma do que está nos céus.." ou então "Vinde a mim as criancinhas... por apenas R$ 49,90!"

Sim. Jesus, o Filho de Deus custa R$ 49,90! O que comprova que Judas nunca foi um bom judeu, pois o vendeu por apenas 30 moedas.

E enquanto a Mattel cobra R$ 70,00 no Max Stell, um boneco que precisa de uma lancha de R$ 40,00 pra fazer uma operação oceânica, a Tales of Glory (fabricante de Jesus) cobra apenas R$ 49,90 num boneco que não precisa de acessório nenhum pra caminhar sobre as águas. Pense nisso na hora de presentear.

Falando no preço do brinquedo ainda, não sei quanto custa os outros apóstolos da coleção, mas o boneco de seu arqui-inimigo com certeza está 16,70 mais caro que Jesus, o Filho de Deus. Faça as contas agora na calculadora do Windows e veja o resultado.

Mas eu ainda acho que o Falcon e os Comandos em Ação são brinquedos mais cristãos que esse aí. Eles sim são verdadeiras réplicas dos cristãos que conhecemos: fazem guerras, atiram... essas coisas...

Verdades, verdades e mais verdades. o que mais chama atenção é que pouco fazemos para reverter o quadro. Parece que nos tornamos nossos maiores pesadelos, tais quais os americanos, ao nos propormos a conter e combater o Terror, nos tornamos com ênfase e louvor o maior de todos os terrores. Somos tudo, menos cristãos. Ou melhor, comos cristãos somos excelentes gladiadores, e para piorar tudo, ainda usamos "O Cristo" para isto.

Conversando com um amigo esta semana ele me manda esta: Se Deus voltasse, o que diria sobre nós, nossas igrejas e nossas ações?
Eu soltei na lata que: - Vocês não entenderam nada... (Deus dizendo com voz de decepção)

Minha esperança é que se houver um julgamento, sejamos todos julgados por nossas intenções, talvez assim eu escape. Quanto a você, que me lê, verifique você mesmo e veja se escaparia... No final acho que todos estariamos perdidos, afinal, nossas ações só não são piores por incompetência própria...

Na esperança de um ser cristão autêntico, autônomo e liberto.

Thiago Barbosa

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Os super poderes do Controle-Remoto



Paul Hutton, funcionário do zôo de Londres, foi trancado em um recinto - como os animais que vivem no local - construído de forma personalizada, onde mostrará a vida do ser humano no habitat natural. Além do quarto com mobiliário completo, o recinto possui uma espécie de pátio ao ar livre para Hutton representar as atividades diárias do homem, entre elas, a alimentação.


O intuito dos zoológicos é realmente este, demonstrar como os animais se comportam, permitindo que as pessoas observem o hábito destes em um ambiente que busca reproduzir o mais realisticamente possível o local onde tais animais são naturalmente encontrados. A proposta do zôo de Londres era justamente esta, apresentar os hábitos de um ser humano, de forma mais verossímil. Seria o início do Reality Show?

Reality show é um tipo de programa televisivo baseado na vida real. Podemos então falar de reality show sempre que os acontecimentos nele retratados sejam fruto da realidade e os visados da história sejam pessoas reais e não personagens de um enredo ficcional. Realmente chama a atenção os princípios motivadores dos “internos” na “casa mais assistida do Brasil”. Em site oficial, 76% dos participantes da edição BBB 2010 apontam o dinheiro como sua única e/ou principal motivação. Esta motivação não está apenas no Reality Show, ela se encontra disseminada nas sociedades brasileira e mundial. Pasmem, não são poucos os casos em que pessoas são motivadas pelas possibilidades de “dinheiro fácil” inclusive nas igrejas – basta mudar de canal que é possível acompanhar vários dos programas religiosos que abordam e se sustentam em tal temática. Infelizmente, com essa ação, poucos de nós sentem-se violentados.

Homossexualidade, agressividade, negociatas, mentira, exibicionismo, futilidade, sexualidade grosseira e dissimulação são algumas das tantas ações abordadas e apresentadas nos programas de realidade. São essas ações que nos incomodam como telespectadores, pois nos afrontam como cristãos. Mas não são estas as ações que formam e sustentam o mundo que conhecemos, vivemos e construímos nesse século XXI? Contra o mundo devastado por tais ações nós não nos indignamos, mas nos indignamos contra os programas de televisão que mostram em nossas casas, escancaram para nossas famílias, que valores como justiça, amor, domínio próprio, mansidão, caridade e benevolência são utópicos demais, distantes demais, inalcançáveis demais.

O que vemos nos shows de realidade são as ações que formam o mundo que nos cerca. Nossa indignação deve ser contra o mundo e todas as ações que nos afrontam como cristãos e, secundariamente, contra os programas televisivos. O BBB é nosso “zoológico televisivo”, lá observamos como a sociedade humana tornou-se banalizada pelo dinheiro e fama (23% das motivações restantes aos enclausurados globais). Observamos um mundo que se encontra em vias de um colapso originado pelo declínio das ações humanas, e agora, contra o eminente colapso, não nos indignaremos?

Os zoológicos não criam animais inexistentes, eles apenas os apresentam, tais quais são na natureza. O BBB não cria humanos hipotéticos, ele apenas os apresenta, tais quais são em nossa sociedade. Contra os programas de realidade e os princípios humanos em declínio abordados em suas programações já existe uma solução simples desde 1950, se gasta pouquíssima energia e não é necessário mais que uma fração de segundos, basta clicarem e mudar de canal (imenso o poder que emana de um simples controle remoto não?). Infelizmente a sociedade, o mundo e seus princípios degenerados continuarão nas ruas, nas esquinas, rondando escolas, trabalhos e igrejas. Infelizmente, contra os princípios degenerados que acometem a sociedade e o mundo em que vivemos ainda não há controle remoto possível. Contra a sociedade em declínio não há medida miraculosa, há apenas a necessidade de encararmos, dialogarmos e sonharmos que princípios como o amor e o respeito voltem a nos governar. Penso que devíamos começar por nós mesmos, mas isso é assunto para outro encontro.

Thiago Barbosa

(voltando a refletir sobre 1 João 5:4)