A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

sábado, 13 de novembro de 2010

Meu primeiro discurso em formatura

“Minha consciência está presa nas palavras de Deus, não posso nem quero retratar-me de nada, porque agir contra a consciência não é prudente nem íntegro”. (Lutero, perante o príncipe Carlos V, em Worms)

Ao contrário do que qualquer fundamentalista religioso possa apontar, a ênfase dessa frase centraliza toda a reforma protestante e toda a cultura ocidental desde o século XVI. A consciência foi força motriz para o protesto em Lutero. Não estou usando este personagem para fins religiosos, mas devo lembrar-lhes que este monge era exímio professor e pesquisador. Portanto, remetendo-me às suas palavras lembro-me da minha condição de professor e pesquisador, e, aí sim, devo recitar diariamente sua frase, nesse momento de lembrança dos anos que passamos sob a tutela da educação. Vocês e eu, ambos somos aqui professores e alunos, pesquisadores e pesquisados na grandeza que é a educação.

Devo primeiramente dizer do meu espanto ao ser lembrado por vocês, carinhosamente pelo que me disseram (embora ainda pense que posso ter traumatizado tantos de vocês), afinal, nas gerações mais jovens, que têm duração de 4 a 6 anos até serem reformuladas, tendemo-nos a esquecer de muitas coisas. Ainda mais numa cultura desmemoriada dos brasileiros, lembrar de pessoas não seria a prioridade, por isso, fico enormemente envaidecido e agradecido pela lembrança. Aí, tanto eu quanto vocês separamos essas festividades, tão merecidas no fim de ano, para lembrarmos-nos de tudo o que vivenciamos em especial na caminhada pelo COC-PALMAS.

Lembro-me perfeitamente da chegada de vocês, crianças ainda, assustados, tanto com a nova escola que se gabava (e ainda o faz) do nível e exigência para com seus alunos (que agora seriam vocês), quanto com o professor extremamente “mal-encarado”, de pouquíssimos sorrisos e afamado pelo rigor quanto à aprendizagem de todos (este fui eu). Seus piores sonhos tornaram-se realidade.

Pouco a pouco nos conhecemos melhor, eu fui aliviando o ritmo, ou será que foram vocês que foram percebendo a importância de entrar no ritmo? A ordem não se sabe. Bem, sei que após toda a seleção natural sobram os fortes. Nesse ponto todos somos fortes, sobrevivemos.

Claro, tiveram entre vocês aqueles que foram contrários à minha lembrança, sempre os há. E eles são tão importantes quanto os que concordaram entusiasticamente. Vou me defender de seus ataques. Todo o meu rigor, toda a minha exigência, todo o meu critério, dentro e fora de sala, nada mais são do que frutos de um apaixonado. Sim, sou um apaixonado pelo conhecimento, frustrado por não tê-lo, mas um eterno apaixonado. E deveria ser diferente? Nada é mais libertador que o conhecimento, vocês já começaram a perceber isso, mesmo com pouca idade, quanta independência se tem com a aprovação no vestibular; os pais são mais benevolentes, a família mais solícita, os amigos mais respeitosos; tudo pelo conhecimento. Mas, com o conhecimento arvora-se a responsabilidade e a certeza de que nunca se atinge o pleno conhecimento, apenas se busca por ele. Para quem tem fé e crê em Deus é mais ou menos o mesmo princípio. Busca-se com todas as suas forças, entrega-se com todas as suas forças, experimentação a sua ação, mas nunca, nunca mesmo têm-se a certeza de conhecer plenamente o que é Deus. Nesse sentido, o conhecimento é um deus, busca-se, entrega-se, experimenta-se, mas, no fim da caminhada têm-se a certeza de que o conhecimento, assim como Deus, é muito mais do que pensamos, estudamos, experimentamos. Mas a graça de tudo, tanto de Deus quanto do conhecimento, está na eterna busca. O que nos motiva é a fé, fé em Deus, mesmo com as dificuldades de se crer, fé no conhecimento, mesmo com a certeza de nunca obtê-lo plenamente. Meu rigor, minha disciplina, minhas exigências, meus estresses, todos são motivados pela minha busca apaixonada pelo conhecimento, pois só com ele se pode ser verdadeiramente livre.

Vocês perceberão que a paixão pelo que fazemos faz toda a diferença. Seja na religião, nos estudos, no amor; a paixão é a força mais extrema que se implica em realizar algo, é aquilo que nos queima o peito, sem a paixão nos falta o ar.

Ao estudar, e todos ainda continuarão a fazê-lo, façam não pelo rigor dos professores, pela imposição da escola, pelo falatório dos pais; mas sim pela paixão aos estudos. Sejam estudantes apaixonados, profissionais apaixonados, pais apaixonados, homens e mulheres apaixonados. Aqui concerto a teoria “darwinista”, não são os fortes que sobrevivem, são os apaixonados. São estes loucos apaixonados que vivem a vida, seja a vida longa ou curta, só vale a pena vivê-la com paixão, com sentimento, com intensidade. Carpe Diem (aproveite o dia).

Hoje é o dia das recordações, das avaliações. Façam comigo um último exercício:

1 – fechem seus olhos suavemente;

2 – respirem profundamente;

3 – tragam à memória cada dia de aula, cada professor, cada aluno, cada amigo, cada funcionário, cada conteúdo;

4 – percebam os momentos de alegrias e tristezas, broncas e elogios;

5 – respirem profundamente e respondam: Tudo isso valeu a pena?

Agradeço muito a paciência de me escutarem ainda mais essa vez. E espero sinceramente que tenha valido a pena. Para mim? Valeu, valeu muito a pena.

Saúde, paz e paixão para todos.

Thiago Barbosa

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