A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Diálogo Inter-religioso como MISSIO DEI “atemporal”

Ao pensar em movimento missionário, missão, ou mesmo cristianismo – que se mostra nesse século XXI como um hiperônimo de um caleidoscópio de hipônimos que emergem desse termo tão abrangente e diversificado – notamos certa indisposição ou reticência, mesmo entre os seguidores da mesma fé e/ou denominação, sobre as formas e formatos das ações desenvolvidas nas igrejas. Estas estruturas ou modelos de se fazer missão se apresentam aos montes, cada qual ressaltando suas virtudes ou posturas, dificilmente constatando e assumindo suas falhas e debilidades. Tal posicionamento propicia o questionamento sobre como se apresenta um movimento missionário que se sustenta junto ao paradigma do mundo moderno globalizado de forma eficaz.

Observa-se que as posturas da missão[1] por vezes se assumem, em certos aspectos, hostis a outras culturas e/ou povos. Quase que detentora do conhecimento da plena verdade – no aspecto positivista – onde não se valoriza ou busca compreender a postura e posicionamento do outro ser humano. Críticas severas são feitas à missão cristã, ela seria uma forma de “intolerância, de arrogância e de violência” [2]. O que pode se assemelhar a uma postura arrogante do agente da missão se tornaria verdadeiramente egoísmo caso não houvesse a ação da missão. Como efetivamente realizarmos missão sem a postura arrogante que é costumeiramente associada a essa ação?

A valorização bíblica da missão – aqui sim como MISSIO DEI – transcorre todo o texto bíblico, e não apenas o trecho neotestamentário. A idéia de “Nação Santa”, ou ainda “Povo escolhido” são terminologias que apontam ao menos para olhares desatentos, aos valores também egocêntricos. Possivelmente essa tendência tenha sido fomentada pela postura Judia em relação às outras nações. A palavra dita a Abraão em Gn 12:1-3 foi “internacional e universal em seu oferecimento, escopo e propósito” [3]. Sendo assim, uma visão mais respeitosa quanto aos sujeitos da missão por parte dos agentes da missão seria o mínimo a se esperar, e nunca uma postura arrogante e egocêntrica de “conhecedores e detentores da verdade salvífica”, que comumente é notada no trato missionário com as culturas.

Observando a mudança no paradigma da missão, David J Bosch observa que, a missão deve responder a problemas nunca antes imaginados, de forma concernente com a essência da fé cristã. Assim: a) o ocidente perde sua hegemonia sobre o planeta; b) há a contestação de estruturas injustas de opressão e exploração; c) há a consciência de que pessoas e meio ambiente são interdependentes; d) os progressos, o desenvolvimento, assumem papéis de divindade; e) temos a possibilidade, por nossa inconsciência ambiental de exterminar a raça humana; f) as teologias cristãs já não podem alegar superioridade sobre as outras teologias que emergem sobre o mundo. Defrontados por uma mudança tão radical nos paradigmas globais podemos afirmar que grande parte de nossas missões estão ainda alicerçadas no medievalismo, enquanto o mundo caminha a passos largos, tendo como força motriz tais diretrizes.[4] Em um mundo onde o cristianismo já não é força hegemônica - e que assume a importância da diversidade comunicativa entre paradigmas diferentes - como se deve viabilizar a MISSIO DEI nesse século de mudanças tão profundas?

Pensar em um movimento uniforme para abordar esses novos paradigmas seria utópico e até ingênuo. Afinal, sérias divergências foram observadas nas Reuniões do Conselho Mundial de Igrejas (CMI) no que concerne à missão e diálogo. Entre essas relações conflituosas destacam-se “os conflitos entre Norte-Sul, o conflito entre evangelicais e ecumênicos e aquele entre igrejas Ortodoxas e o CMI” [5].

A urgência do diálogo inter-religioso se dá no âmbito de a teologia cristã de missão rever seus valores e preceitos de forma a abordar e, eventualmente, posicionar-se respondendo as questões existenciais mais profundas que emergem do novo paradigma epistemológico do século XXI. Percebendo nas culturas e pessoas não cristãs a manifestação de um Deus universal e, por que não, plural. Dificuldades são encontradas quando percebemos posicionamentos mais enrijecidos de pessoas que não estão dispostas a dialogar para estabelecer um caminho de convivência com as outras pessoas, agora, despidos da arrogância e egocentrismo dos cristãos “historicamente conhecidos” [6], há de se estabelecer novos tempos para a MISSIO DEI no mundo.

“Missão e diálogo, respectivamente testemunho, desenvolvimento de diálogo com pessoas de outras religiões doravante são considerados no CMI como características inseparáveis, porém distintas da transmissão cristã da fé” [7]. Cria-se aqui uma dicotomia no discurso evangelical; tais pensadores da missão evangelical se propõem a assumir a importância do dialogo religioso, sem, contudo, modificar sua postura de fazer missão. Uma incoerência discursiva que denuncia uma negligência na reinterpretação das necessidades do movimento missionário e da missão em si. A missão feita nesses moldes denuncia-se como conquistadora, opressiva, coercitiva, e jamais libertadora e salvífica como enunciada nos padrões da MISSIO DEI, corroborando com John Stott e Walter Kaiser Jr (cf. notas 2 e 3).

Por diálogo inter-religioso entende-se “conversação preparada entre pessoas de diferentes religiões a respeito de temas previamente combinados[8]. Destacando-se o “diálogo da vida”, como a convivência entre os diferentes; “diálogo ético”, como postura conjunta perante problemas universais; e “diálogo sobre diálogo”, como a discussão sobre o diálogo inter-religioso nas comunidades de fé.

A postura inicial para o diálogo religiosos é a resposta para a arrogância que ronda as ações missionárias. “Cristãos podem iniciar o diálogo, podem fomentá-lo ou até mesmo acatar a iniciativa de outros. De forma alguma, porém, cristãos deveriam tentar determinar diálogo, para que este permaneça genuíno[9]. A postura receptiva e humilde, contrastante com a arrogância e prepotência inicial são condições sine qua non para o desenvolvimento da missão como MISSIO DEI.

Vemos assim no discurso apologético da missão protestante, principalmente no âmbito brasileiro, uma semelhança gritante com o discurso da igreja ortodoxa. O dialogo inter-religioso é vilipendiado, como se fosse totalmente alheio ao pensamento e estruturação das ações missionárias. O testemunho cristão (apologética) é vista e apresentada como martírio da igreja frente ao restante do mundo.

“O que devemos àqueles que têm outra fé exige de nós com urgência ainda maior que nos portemos como os antigos apologetas cristãos, confirmando a verdade, seja ela qual for, ressaltando, porém, ao mesmo tempo, a abundância e autenticidade da verdade salvífica cristã, mesmo que com isto nos exponhamos ao risco da perseguição” [10].

Ao vencermos este posicionamento dogmático da salvação do homem, verteremos para os apontamentos da CMI em Nairóbi, 1975. “(...) cremos que em nenhuma geração Deus deixou de se testemunhar. Tampouco podemos excluir a possibilidade de que Deus fale aos cristãos a partir de fora da igreja” [11]. Imbuídos desse pensamento perceberemos a urgência de rever os paradigmas e dogmas que perfazem a ação missionária em nossas instituições/organizações/igrejas, de modo tal que “nunca deveríamos condenar ou desprezar outra cultura, mas, ao invés disso, respeitá-la” [12].

“O verdadeiro cristianismo da Bíblia não é uma religiãozinha escapista, egoísta, quentinha, aconchegante e segura. Pelo contrário, ela mexe profundamente com a nossa segurança e garantia. Ela é uma força explosiva e centrífuga, que nos arranca do nosso estreito egocentrismo e nos atira para o mundo de Deus, a fim de testemunhar e servir. Precisamos, pois, encontrar maneiras práticas, seja individualmente, seja através de nossas igrejas locais, para expressar esse comprometimento” [13].

Deste modo é possível que os conceitos a respeito da missão sejam revistos, que seus agentes não sejam mais comissários das instituições, mas sim, agentes de um reino onde a salvação é direcionada a todos. Finalmente a salvação irá ao mundo todo, não como imposição, mas como amizade e respeito. Deus será manifesto ao mundo, e não à dogmática cristã institucional. Diálogo é manifestação de Deus no mundo, a tempo e fora de tempo.



[1] Aqui se opta pelo uso do termo missão correlacionando conceito parâmetros que, mais especificamente, seriam próprios da missiologia ou movimento missionário. Assim, missão torna-se, no presente trabalho, um termo mais abrangente que engloba desde o “pensar em fazer missão”, a “forma de fazer missão” ou o “ato de fazer missão”.

[2] STOTT, John – Nosso Deus é um Deus missionário. Em: Ouça o espírito, ouça o mundo. São Paulo: ABU, 1998. P.359.

[3] KAISER JR, Walter. A chamada missionária de Israel. Em: WINTER, Ralph; HARWTHORNE, Seven. Missões transculturais: uma perspective bíblica. São Paulo: Mundo Cristão, 1987. P.28.

[4] BOSCH, David J. Mudanças de paradigma na missiologia. Em: Missão transformadora – mudanças de paradigma na teologia da missão. São Leopoldo: Sinodal, 2002. P. 225-237.

[5] LINNEMAN – Perrin, Christine. Conselho Mundial de Igrejas. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.73.

[6] Referindo aos conhecidos casos de uso da ação missionário como forma de coerção e domínio no desenvolvimento imperialista da Europa e dos Estados Unidos junto aos povos da África e America Latina.

[7] LINNEMAN – Perrin, Christine. Conselho Mundial de Igrejas. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.74.

[8] LINNEMAN – Perrin, Christine. Conselho Mundial de Igrejas. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.79.

[9] LINNEMAN – Perrin, Christine. Conselho Mundial de Igrejas. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.81

[10] Declaração ortodoxa sobre missão promulgada em 1988 Neápolis/Grécia. Cf em: LINNEMAN – Perrin, Christine. Posição confessional: vozes da igreja ortodoxa. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.99.

[11] Cf. em: LINNEMAN – Perrin, Christine. Conselho Mundial de Igrejas. Em: Missão e diálogo inter-religioso. São Leopoldo: EST, Sinodal, CEBI, 2005. P.86.

[12] STOTT, John – Nosso Deus é um Deus missionário. Em: Ouça o espírito, ouça o mundo. São Paulo: ABU, 1998. P.361.

[13] STOTT, John – Nosso Deus é um Deus missionário. Em: Ouça o espírito, ouça o mundo. São Paulo: ABU, 1998. P.375.




Thiago Barbosa

sábado, 13 de novembro de 2010

Resumo e comentário: Introducción a los métodos de La exégesis bíblica (Joseph Schreiner)

A exegese dos escritos sagrados de Israel tem sua origem antes do Novo Testamento. Nos livros do Antigo Testamento já se encontram interpretações e explicações a respeito da palavra de Deus que havia sido registrada e eram promulgadas às pessoas, prova disso são as tradições, traduções e interpretações emanadas das escrituras, mesmo sem uso metodológico exegético.

Possivelmente o primeiro grande esforço exegético tenha sido a tradução da “LXX”. A septuaginta teve o desafio de acessar uma língua consonantal, com padrões de vocalização e idéias totalmente diferentes. Na verdade tentaram transportar toda uma cultura característica do Crescente Fértil, emoldurada com características peculiares nos aspectos sociológicos, econômicos, políticos, religiosos, traditivos e, de modo desafiador, expor essas realidades a uma cultura e civilização totalmente distinta. Oriundos desse esforço hercúleo para tornar acessível um texto caracteristicamente judeu para a sociedade helênica, e em contrapartida para os cristãos, podem notar distinções entre o processo interpretativo de ambas as realidades, tanto judaica como cristã. Para os judeus, a escritura em seu conteúdo e extensão total é a única norma para o pensamento teológico, palavra por palavra a aplicam a suas vidas através dos midrash. De modo distinto, a comunidade de cristãos primitivos acessam o Antigo Testamento se dá por intermédio do Espírito que permite de modo retrospectivo como referência à plenitude escatológica.

No período referente aos pais da igreja, o Canon do Antigo Testamento não era uma realidade fechada, desse modo houve a possibilidade de se inserir os textos que formam o Novo Testamento. Assim há a proposta de um acesso metodológico diferenciado da usual literalidade, o acesso alegórico é uma forma de transcender e interpretar as escrituras por intermédio da metáfora. Emanam agora dos textos verdades mais profundas e inatingíveis até então. Em Teodoro há o retorno da interpretação textual, no período que caminha para o fim do período dos pais da igreja retornamos a uma interpretação que caminha para um sentido ético. Vemos em Teodoreto de Ciro a intenção de transmitir as possibilidades de interpretação exegéticas possibilitadas até então. No ocidente aponta-se para um tríplice sentido na interpretação bíblica: 1)histórico; 2)místico; 3)ético.

Com o estudo da patrística chegamos à idade medieval. Torna-se possível elucidar a mensagem cristã mesmo no âmago de textos do Antigo testamento. Mesmo sem um ideal conhecimento das línguas originais formadoras do Canon, os estudiosos medievais caminharam de forma sustentada para uma interpretação literal consistente. A exegese do Antigo Testamento recebe um valoroso auxilio advindo do acesso à exegese judia.

No período que perfaz a Reforma vemos o surgimento do ideário conhecido como Sola Scriptura, ou seja, somente a escritura é parâmetro para a fé e a construção doutrinária eclesiástica. A investigação escriturística volta-se, definitivamente, para o acesso às línguas originais, bem como a formação do conceito de que o Novo Testamento é a chave interpretativa para o Antigo Testamento. A ortodoxia protestante aponta para a inspiração total do texto bíblico, tal qual sua inerrância, ambas de origem divina.

A idade moderna traz consigo o método histórico-crítico e uma racionalização profunda sobre os textos bíblicos, essencialmente o Pentateuco. A partir de Immanuel Kant percebemos o levante do rigor científico no que diz respeito à interpretação da bíblia. Para J. G. Herder o texto do Antigo Testamento ganha vida na experiência do leitor que, intuitivamente, penetra nele e permite que o texto alcance uma relevância teológica e comprometedora frente ao homem auto-suficiente. A partir daqui temos os diversos acessos metodológicos oriundo do hiperônimo “método histórico-crítico”, citando como exemplos Ewald e Wellhausen.

Aqui percebemos a saga de diversos pensadores e suas tentativas de acessarem a palavra de Deus. O texto ganha força e atualidade na vida das pessoas que buscam nele sentido de vida. os textos são defesas das piores horas. É forma de responder a vida. Agrega-se neles resistência e utopia frente às tragédias. São por tudo chaves da vida. Somente depois de um trabalho metodologicamente correto a Bíblia poderá pronunciar a palavra que tem que proclamar para cada época.


Thiago Barbosa

Resumo e comentário sobre: Diacronia – os métodos histórico-críticos (Horácio Simian-Yofre)

O autor inicia expondo a notável importância que o método histórico critico teve no desenvolvimento de uma pesquisa bíblica série e expõe a teorização dos três termos que compõem e formam o nome dessa metodologia exegética.

O método é a possibilidade de revisitar e reprisar o desenvolvimento de uma determinada pesquisa. Sua descrição assemelha-se à apresentação de David Hume sobre o empirismo e mostra a importância de que, utilizando-se os mesmos métodos propostos, possamos alcançar os mesmos “resultados”, o que caracteriza o alto teor de cientificismo necessário para o desenvolvimento do método. Já no aspecto histórico, vemos a necessidade de se “ler” e “interpretar” o texto bíblico com os critérios peculiares do tempo de escrita e leitura, a interpretação própria dele. Deve haver o cuidado de não acessar o texto passado com os olhos atuais, mas sim buscando a realidade que emerge da aplicação histórica na comunidade em que se estuda. De certo modo é a tentativa de preservar a intenção do autor e a intenção do leitor. A crítica é a perspectiva de remontar valores, estabelecer distinções e, com base nelas, poder tecer julgamentos a respeito do texto, eventualmente o próprio exegeta está imerso em valores pessoais que deixa contaminar o estudo textual em desenvolvimento. Assim, todo método nasce ligado aos cordões das pré-compreenssões culturais.

Como toda metodologia, não sendo diferente com o método histórico-critico, há condições limítrofes. Entre as quais são citadas: 1) a dificuldade de estabelecer relação com outros resultados válidos; 2) a disparidade entre as propostas da metodologia quanto ao texto bíblico, e sua “releitura histórica”, em relação com a proposta mítico-religiosa para com o texto bíblico e sua realidade salvífica; 3) a incapacidade de aproximação entre texto e leitor em um âmbito atualizado.

No aspecto da práxis usual da metodologia exegética histórico-critica, o autor assemelha-se a Gehard Haesel em sua obra sobre a metodologia do Antigo Testamento, o termo “método histórico-crítico” ganha uma conotação de hiperônimo, sendo constituído por uma gama de outras propostas metodológicas que sustentaria esse gênero metodológico maior. Desta forma, a crítica da constituição do texto, a crítica da redação e da composição, a crítica da tradição e das fontes, entre outras. Todas são hipônimos em relação ao hiperônimo que é o método histórico-crítico.

Fabio Py Murta de Almeida, em comunicação feita no IV Congresso Internacional de Ciências da Religião aponta para uma necessidade de repensarmos o termo hiperônimo método histórico-critico e, com base em propostas de escolas da história, caminharmos futuras pesquisas usando termos como: 1)método histórico-redacional; 2)método histórico-social; 3) método histórico-cultural. Apoiado em eruditos como Klaus Berger, Rainer Kessler e Paul Ricouer.


Thiago Barbosa

A pedidos de Teresa Akil: Meditando sobre o "o temor de YHWH"

“O temor de Javé é o princípio do saber, porém os idiotas desprezam a sabedoria e a disciplina”.

1 – A pessoa não deve se contentar com o que sabe, mas transformar o próprio saber em busca e abertura para um saber maior, que traga realmente mais vida para sai e para os outros.

O contentamento com o que se sabe é o desprezo pela própria busca da vida. O ser humano deu-se como grandeza orgânica por sua busca por interação e conhecimento de todo o ambiente que o cerca. De igual modo as relações humanas se desenvolveram na expectativa de que todas as interações entre os humanos os fizessem conhecer ao outro (próximo) de modo a compreendê-lo e ajudá-lo. Assim, contentar-se com o conhecimento que já se tem é assumir a limitação de sua busca pela compreensão e auxílio ao próximo. Utilizando da metodologia alegórica para interpretar o verso “ama ao teu próximo como a ti mesmo”, notamos que se ater ao conhecimento que se tem e negligenciar a busca pelo conhecimento do próximo é negligenciar a recomendação de Jesus nesse mesmo verso e, de igual modo, negligenciar a urgência humana de estabelecer a busca de interação com o semelhante e assim conhecê-lo, percebendo uma expansão de horizontes das nossas possibilidades. A visão de mundo que outrora se mostrava embrutecida, diminuta, enviesada, agora com a perspectiva holística da busca pelo conhecimento, vemos um mundo aberto, colorido, em plena expansão, com a percepção de vida que vem do próximo.

O temor de Javé, ou, a reverência quanto aos princípios de Deus, mostra-se caminho unidirecional para a o conhecimento do próximo, ou, é o princípio do saber. O mundo abre-se sob a reverência que direciona a busca pelo conhecimento. O saber torna-se a própria divindade ordenadora do mundo, sob ela, o caos social que eventualmente se levanta frente às hordas de violência são aplacadas. O ódio se esgota com o conhecimento pleno do fôlego divino no outro humano. É o conhecimento que permite ao homem concluir-se como parte formadora e integral de um mundo que se esvai sob os perigos das catástrofes ecológicas e, esse mesmo homem, dispõe-se a entender, interpretar e agir mediante o caos que se instala climaticamente. No mundo, o conhecimento se mostra como ordenadora do caos social instalado, e, na percepção de que somos todos e tudo o mundo, e, portanto, reverenciar os princípios de Deus (Javé) é o início do conhecimento (saber).

Javé e saber, Deus e conhecimento; quando percebermos que uma grandeza (divindade) não exclui – necessariamente - a outra, perceberemos quanto tempo perdemos, quanto conflito geramos, quanto suor vertemos, quanto sangue derramamos, por apenas sermos tolos em não percebermos o conhecimento e, o fôlego divino, que emana do nosso co-igual humano. Seja qual for; de onde for e, como for.


Thiago Barbosa