A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

sábado, 29 de maio de 2010

QUANDO SE USA, QUANDO SE VIVE... (mais uma arroubo pastoral)

Quando se usa, quando se vive.

“Ou como podes dizer ao teu irmão: Irmão, deixa-me tirar o argueiro que está no teu olho, não atentando tu mesmo para a trave que está em teu olho? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho e então verás bem para tirar o argueiro do olho do teu irmão.” Ou ainda “Portanto tudo que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós a eles; porque esta é a lei e os profetas.” A ética é um princípio humano, infelizmente vilipendiado pela religião, mesmo sendo constante sua aparição e exultação nos textos bíblicos. Assim a religião foi tomada como alienação dos direitos humanos, direitos que nos fazem iguais tanto entre os homens quanto entre os “deuses”. Esse é o uso do poder, esse é o uso da justiça, esse é o uso da ética sem a moral.

O uso do poder é intrínseco ao ser humano. “Darwinisticamente” o forte sobrevive, seja com a ação do ambiente, seja com a ação da autoridade vigente no grupo em que se insere. É assim que se traça a eterna luta dos animais pelo poder do grupo, assim, quando se detém o alimento, escraviza-se o mais fraco pelo estômago. O poder de deter o alimento nos torna tiranos e, para manter esse poder, despimo-nos da moral que nos torna humanos, da ética que nos torna cristãos religiosamente concebidos e, “maquiavélicamente” negociamos decisões por cristo em troca de cestas básicas. A sentença de Maquiavel é cáustica e indolente na mente e coração dos homens: “Quer conhecer o homem? Dá poder a ele.” Quanto tempo a religião se travestiu de bondade para que o poder fosse mantido? Mas a relação com Cristo subverte o poder instituído e torna-se um grito à responsabilidade pessoal de cada homem.

A justiça tornou-se utopia na sociedade impune do século XXI. Hoje, confunde-se justiça com lei. Justiça é o liquido que sacia a boca ressequida do que foi vitimado, mas hoje há a negociata, os arranjos, os trâmites legais, as verificações de pena, as liberdades provisórias, os regimes semi-abertos. Enquanto isso, a boca vitimada sofre as dores perpétuas de não se ter o ente querido. São fendas intransponíveis que teimam em abrir, rasgar, dilacerar aqueles que clamam pelo refrigério da justiça e só recebem a salmora da lei. Salobra, Morna, repulsiva, assim é a lei nesses dias em que a utopia é clamar por justiça. O grito da sociedade é o grito choroso do salmista: “Quem me dera de Sião viesse a salvação.”

Ah! Acho que já ouvi falar da ética. Não era ela uma lenda, uma representação mítica dos deveres dos homens para com os homens? Acho que hoje ela, lendária e falseada, é reclusa aos dizeres infantis, aos diálogos de heróis, aos discursos dos deuses. Mas devo dizer que gostaria de conhecer a ética, afinal, se ela realmente existiu já se foi, e em seu lugar restou o homem que assume seu egoísmo como necessidade de toda uma comunidade. A ética foi travestida, tornou-se uma marionete, risonha, colorida, alegre, mas que, ao não ter as mãos dos que se põem a manipulá-la, é morta, é inerte, é sombra e lembrança do que já foi um dia. Já houve ética, mas quando a consciência humana foi queimada em sacrifício ela se foi, atrelada ao sangue sacrificado da consciência humana.

Resta ainda uma sombra de desejo. O mais puro desejo humano de que ressuscitem sua consciência; de que seu cérebro não mais seja sobrepujado. Assim talvez a consciência ressurja; a ética renasça; a justiça floresça; o poder enfraqueça; e nós aprendamos o que é viver o cristianismo.
Thiago Barbosa

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