O que é pecado?
O pecado tornou-se, entre outros, um grande chamariz da instituição igreja preocupada em prospectos numéricos no seu desenvolvimento. O medo e a insegurança, usualmente adjetivos atrelados ao tema pecado, são as forças que por vezes faz com que as pessoas se aproximem da religião, criando nestes, sentimentos que os escravizam às suas denominações. A pastoral que entende a ação de Deus na história e se preocupa com a percepção holística da salvação em Jesus busca repensar o pecado como força escravizadora e temerária aprofundando os questionamentos humanos aos níveis mais profundos e existenciais, e, assim, buscando compreender a dimensão do pecado na vida humana.
Tanto a criação como a redenção devem ser pensadas num co-texto cristocêntrico. Jesus Cristo é o modelo exemplar de homem, já que desenvolve plenamente as esferas propostas: filho, senhor e irmão. O pecado original é uma situação geral de decadência da situação humana, criando as possibilidades concretas para que haja a mentira, o furto, o ódio e a exploração. Assim sendo, o pecado é a deturpação ou conduta desviante das esferas centrais do desenvolvimento humano: o homem como filho, o homem como senhor, e, o homem como irmão.
A teologia, compreendendo que em Deus há a essência de vida para os humanos (não apenas cristãos, mas em um sentido mais amplo), percebe-se a relação intrínseca entre o cristianismo e a vida. O pecado seria não apenas uma conduta desviante moral, refém dos preceitos de uma cultura específica ou abordagem étnico-social esperada, mas, acima de tudo, torna-se aquilo que se opõe à vida humana e/ou àquilo que a mantém e permite. Pecar contra Deus é pecar contra a vida e sua manutenção, seu desenvolvimento.
Nossa unidade com Cristo pertence ao plano eterno de Deus. E Deus realiza e realizou este plano – mesmo com e contra o pecado – para nossa redenção e glorificação. Jesus Cristo foi o homem que conseguiu ser totalmente filho, senhor e irmão.
Inicialmente percebe-se a necessidade da desmistificação da temática, bem como, principalmente a abordagem do pecado original vinculado ao texto de Gênesis. Esta vinculação é sumamente agostiniana e, a partir daí, ganha força descomunal no ideário cristão. Nota-se nesse sentido que a possibilidade de o pecado original estar vinculado ao texto de Gênesis, capítulo três ser um erro de proposta metodológica de ordem exegético-hermenêutica. Assim sendo é refém de uma metodologia histórico-gramatical e de abordagem fundamentalista-alegórica. Uma análise, mesmo superficial, utilizando-se da crítica das fontes e da crítica das tradições poderia elucidar vários aspectos do texto como: seu uso, sua intenção, ou mesmo o seu lugar vivencial (sitz im lebem). Ali, onde antes ocorria a “queda original” da humanidade vê-se uma possibilidade de acesso à consciência humana e uma chamada à liberdade de um mundo não apenas restrito ao paraíso; agora o lugar vivencial humano é muito mais amplo e abrangente.
Imersos nesta “nova” percepção, vemos uma urgência em apontar para a perspectiva neo-testamentária, sobretudo nos escritos paulinos, já que este se dispôs ao diálogo com a cultura e preocupou-se profundamente com a condição existencial daqueles que ainda não se encontravam como sujeitos religiosos. A perspectiva paulina é holística de maneira que não vilipendia os princípios de salvação/redenção de Cristo ao universo religioso, antes se preocupa em universalizar a vida cristã e o próprio Cristo como o algoz do pecado e libertador do homem para a vida que é, assim, a essência divina desse homem.
O caminho para uma pastoral imersa no pensamento teológico e relevante para século XXI possivelmente será o de revisitar os dizeres que se tornaram censo comum dos ambientes eclesiásticos, entendendo sua origem e formação, e, então, desmistificando o pecado como conduta desviante de uma moral ou ética enviesada por grupos de domínio. Haverá assim a possibilidade de se apontar para a supremacia da salvação/redenção, mostrando-a intimamente relacionada à abominação do novo sentido de pecado. O pecado deixaria de impor-se por meio do medo e do receio ao inferno, mas se mostraria “demoníaco” às pessoas por afrontar a especificidade máxima do ser humano que é a vida em toda a sua plenitude. A fuga do pecado pelo sujeito religioso não se daria pela imposição de uma tradição distante e inerte, ou de um discurso ideologicamente concebido pelo líder, ou ainda pela relação de domínio/opressão da luta de classes; essa fuga se daria pela essência do homem que clama por uma vida sustentável, livre e plena.
Thiago Barbosa
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