A arte de pensar livremente

A arte de pensar livremente
Aqui somos pretensiosos escribas. Nesses pergaminhos virtuais jazem o sangue, o suor e as lágrimas dos que se propõem a pensar com autonomia. (TeHILAT HAKeMAH YIRe'aT YHWH) prov 9,10a

terça-feira, 22 de março de 2011

Missão e teologia


Pensando sobre a igreja nos dias de hoje, vemos a necessidade de se arrolar novamente valores que foram fundamentos durante toda a tradição da igreja, valores estes que foram basilares na história da igreja, como a conhecemos. A inserção do cristianismo sob uma ótica holística de mundo, mais como experiência com o sagrado do que a construção dogmática sistematizadora de uma religião. O sujeito religioso moderno comumente abdica da possibilidade racional para, de forma apática, abraçar-se à dogmática religiosa. Tal ato de insensatez, cometido não só modernamente, mas durante toda a história cristã (obviamente generalizo a fim de possibilitar análise), fez com que a religião assumisse uma perspectiva distante e austera do mundo. O cristianismo tornou-se alheio ao mundo de onde ele emanou e para onde ele foi pensado. A força ganha pela expressão “fugir das coisas do MUNDO” causou, aos cristãos, condutas que os tornaram alienígenas em seu próprio mundo, sua mensagem já não condiz com aqueles para a qual foi pensada, ela enfim caducou.   O desafio da presente igreja é embebedar-se do MUNDO que a cerca, interpretando e revisitando seus valores e filosofias, e repaginando sua mensagem. Nesse sentido é necessária uma teologia apofática, em um primeiro momento, onde a igreja se disponha às dores e dúvidas existenciais e profundas do MUNDO. Após internalizar tais sentimentos, elaborar suas posições e ações, falando, finalmente, de forma efetiva do Cristo e para os quais Ele veio, todos.

Neste sentido, embebida de MUNDO e ciente de que fala deste e para este, a igreja põe-se a dialogar com a cultura, forma máxima de expressão dos povos e, sem dúvida, linguagem prismática que também forma a própria igreja. Em sua essência estão os pressupostos da vida e da liberdade. A igreja deve em síntese ser vida e liberdade, sua ação deve refletir esses ideais, seu discurso deve ser perpassado desses ideais, sua vida deve transparecer esses ideais e é para esses ideais que se deve trabalhar. Porém o cristianismo, que é vida e liberdade e era intimamente envolto ao povo e às culturas deste, tornou-se refém do Capital, gerando a morte. Os arroubos numéricos e de resultados das comunidades de fé, refletem o perigo de perder-se no MUNDO sem os princípios basilares de vida e liberdade. A religião inicialmente subversiva e popular preocupada com a igualdade do ser humano viu-se refém de seu sentimento de vaidade e apresenta-se Burguesa. Nesta religião burguesa, o futuro messiânico se acha gravemente ameaçado. E isto em primeira linha, não porque se converte em pacificação e consolação, em ópio para aqueles que nada têm e que são sem futuro, mas porque serve para confirmar e fortalecer aqueles que já têm e possuem; aqueles que são, de qualquer maneira, ricos de perspectivas e de futuro neste mundo. A igreja é, neste sentido, voz profética de um mundo refém do Capital e morto pelo mesmo; chamando à vida e à liberdade seus seres formadores, as pessoas, e mantendo esta condição sine qua non para sua existência.

O cristianismo deve entender-se não como multifacético em seus milhares de rixas e divergências, mas assumir-se como unidade que milita a vida e liberdade. A perspectiva unitária do proto-cristianismo ocasiona a diminuição das distorções e a dissipação aleatória de forças em abordagens vis e focaliza os esforços em prol das “gentes”. Assume-se a construção de um mundo, não vindouro, mas presente; onde todos cristãos ou não têm vida e liberdade, valores apregoados por humanos, nãos apenas sujeitos religiosos. A ação missionária, a missão, não é de modo algum produto exclusivo de uma denominação ou linha dogmática; ela é produto do ser humano, mais amplo que o sujeito religioso, afinal já não seria mais possível discernir entre sujeito humano e sujeito religioso, pois ambos refletiriam a mesma essência, a vida e a liberdade como mensagens humanas, como mensagem cristã.

Thiago Barbosa

Nenhum comentário:

Postar um comentário