Mais uma tragédia oriunda do volver da deusa soberana “Gaia”, e, novamente, mais um burburinho sobre as ações de Deus ou o diabo nas insignificantes vidas humanas. A divindade, ou a necessidade dela, sempre acompanhou-nos como humanidade em eterna transição. Pedras, árvores, astros, animais e nós mesmos sempre nos mostramos e fomos instituídos como deuses aos menos favorecidos. Dessa forma os poderes instituíram-se, dessa forma a força foi aplicou, dessa forma fomos feitos diferentes, assim criou-se a diferente gama de aparições em que homens, nos mais diversos grupos, se emolduram e formam castas de poder sob a palavra ritualística do sacerdote.
Saímos da simplicidade dos coletores e das divindades instituídas pela natureza e controlamos nossa comida. Abandonar a coleta e aprimorar modos de produção do alimento levou-nos a aprimorar as divindades que nos cercavam. Esses divinos seres agora tinham nomes, histórias, parentescos, relações de poder que davam força às nossas próprias relações de poder. Mas Gaia sempre foi soberana.
Dias atrás vivenciamos novamente as forças insondáveis, imensuráveis, incontroláveis de Gaia, precisamente o Haiti esteve em seu caminho de fúria. Mas a deusa foi maldosa, intocável, não havia sacrifício que pudesse ser feito. Gaia é organismo vivo, voraz, nós somos nada, pó, cinza, farelo, ápice da insignificância aos pés de Gaia, e não há sacrifícios que a controlem, ao menos não por completo, afinal, somente o sacrifício de nosso clã humano, por completo, daria a possibilidade de que Gaia fosse deusa soberana, e, mesmo assim, Gaia ainda teria seus rompantes de mal humor repentinos.
Gaia é a personificação de “o antigo poder matriarcal” das antigas culturas Indo-Européias. É a “Grande Mãe” que dá e tira, que nutre e depois devora os próprios filhos após sua morte. É a força elementar que dá sustento e possibilita a ordem do mundo. Nos mitos gregos, os conflitos entre Gaia e as divindades masculinas representam a ascensão do poder patriarcal e da sociedade grega sobre os povos pré-existentes.
Lembro-me da frase, mas foge-me o autor, ponho assim mesmo, espero que sem perseguições por direitos autorais (risos). “Antes eu te conhecia só de ouvir falar, agora, meus olhos te contemplam e tenho pena do barro humano.”
A Terra é um planeta ativo, borbulhando em suas entranhas, com uma crosta formada de placas que tendem a mudar de posição em busca de um maior equilíbrio quando a pressão subterrânea aumenta. Obviamente, fazem isso sem dar a menor importância para a destruição que causam. Cataclismos naturais, como o do Haiti ou o tsunami de 2004 no oceano Índico, que causou em torno de 230 mil mortes, expõe a crua realidade da vida na Terra: precisamos da natureza, mas a natureza não precisa de nós. No nosso desespero, e sem poder prever quando cataclismos dessa natureza irão ocorrer, atribuímos tais eventos a "atos divinos". Nisso, não somos muito diferentes de nossos antepassados, que associavam divindades a quase todos os aspectos e fenômenos do mundo natural.
Talvez a transição do panteísmo ao monoteísmo, sobretudo no ocidente, tenha removido Deus do contato mais direto com os homens, relegando-o a uma presença etérea, distante da realidade do dia-a-dia. Mas muitos continuam atribuindo o que não entendem a "atos divinos", seguindo a receita tradicional do "deus das lacunas": a fé começa onde a ciência termina.
Talvez faça mais sentido associar esses cataclismos a uma indiferença divina. É horripilante testemunhar a crueldade -e até mesmo a estupidez- de certos homens de fé nesses momentos difíceis. Um exemplo é do pastor evangélico americano Pat Robertson, que recentemente atribuiu o terremoto a uma punição divina contra o povo haitiano, que supostamente assinara um pacto com o diabo para conseguir obter sua independência dos franceses. Nossos antepassados nas cavernas teriam concordado.
Dentro do contexto desta coluna, a tragédia provocada pelo tremor no Haiti nos ensina ao menos duas coisas. Primeiro, que a ciência tem limites, e que existe muito sobre o mundo que ainda não sabemos. Porém, não é por isso que devemos atribuir o que não sabemos explicar a atos sobrenaturais. Nossa ignorância deve abrir caminho ao conhecimento e não à superstição. Segundo, aprendemos que a vida -e aqui estamos nos incluindo- é extremamente frágil e deve ser protegida a todo custo. Nosso planeta, apesar de demonstrar fúria ocasionalmente, é nossa única morada viável. Devemos tratá-lo com o respeito que merece.
http://marcelogleiser.blogspot.com/2010/01/ciencia-religiao-e-o-haiti.html
Nossos deuses tornaram-se assassinos (vindos dos discursos de seus criadores); bocas, dentes, garras e, principalmente palavras, que dilaceram e buscam carne humana que possa tragar. As igrejas se refugiam na carnificina, “quem me dera de Sião viesse o livramento de Israel” (Sl 53,6a). Mas dos lugares de esperança não vem nada, afinal nossos deuses são tão maus quanto nós mesmos.
Que possamos esquecer as superstições, deuses e demônios serão sobrepujados por nosso relacionamento aos que necessitam. Assim, olhando nos olhos do povo que clama, seremos enfim o livramento do povo; seremos deuses, pois, afinal, Deus terá habitação em nosso intimo (ao menos o Deus do Cristo Galileu, amoroso e preocupado ),quiçá de uma vez por todas.
Thiago Barbosa
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